domingo, 30 de outubro de 2011

Impacto dos Preços Internacionais na Balança Comercial Brasileira

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Impacto dos Preços Internacionais na Balança Comercial Brasileira.


A receita de exportações brasileiras têm subido de forma expressiva nos últimos anos, atingindo quase USD 250 bilhões em 2011 (últimos 12 meses até setembro de 2011), uma alta de 87 % quando comparado com o mesmo período de 2006 (Veja as principais commodities exportados pelo Brasil em http://migre.me/61v9b). A importação também cresceu forte neste período, com alta de 150% .

O objetivo deste artigo é realizar um estudo simples, mostrando que, no caso das exportações, o aumento dos preços explica a maior parte do aumento da receita, e, no caso das importações, o aumento do volume é responsável pelo seu crescimento. Este estudo é, em parte, baseado em trabalho de 2004 realizado pelo Banco Central do Brasil, disponível em http://migre.me/61tXB.


Para realizar este artigo, foram utilizados os dados do Ministério do Desenvolvimento (MD) disponíveis no site aliceweb2.mdic.gov.br. Foram utilizados os capítulos da NCM – Nomenclatura Comum do Mercosul, que divide os bens exportados e importados em 97 categorias diferentes. O MD divulga, para estas 97 categorias, o valor transacionado em dólares e o volume em quilogramas. O preço médio de cada categoria foi calculado simplesmente dividindo o valor financeiro pelo volume.

Como base temporal para este estudo, estamos considerando como “ano” o período acumulado de 12 meses terminados em setembro, pois o último dado disponível é setembro de 2011, e este autor achou mais interessante utilizar os dados em base anual. Assim, quando falamos 2006, estamos nos referindo ao período entre outubro de 2005 e setembro de 2006, e assim sucessivamente.


Estimamos o impacto dos preços internacionais nas exportações nos anos de 2007 a 2011. Para isto, consideramos o volume exportado fixo igual ao ano de 2006. Por exemplo, para saber o impacto dos preços nas exportações de 2007, mantivemos o volume de 2006 com os preços de 2007, e assim sucessivamente, até o ano de 2011, sempre mantendo fixo os volumes de 2006. O impacto do aumento do volume foi calculado apenas pela diferença entre o valor efetivo das exportações de 2011 e o valor estimado com volumes constantes. Os resultados estão apresentados no gráfico I e nos comentários a seguir:

Gráfico I


Fonte: Ministério do Desenvolvimento
Elaboração própria



Em 2006, o valor financeiro das exportações atingiu USD 132,6 bilhões. Em 2007 e 2008, o aumento de preços internacionais foi responsável pelo acréscimo de 12,9 bi e 38,9 bi nas exportações, respectivamente. Em 2009, houve queda nos preços internacionais, e o efeito preço reduziu a receita das exportações em USD 13,8 bi. Em 2010 e 2011, com a volta do crescimento mundial, os preços voltaram a subir, e o impacto na receita foi de 17,6 bi e 42,5 bi, respectivamente. O aumento do volume representou acréscimo de apenas USD 16,3 bi nas exportações no período entre 2006 e 2011.

Com relação às importações, o efeito é o oposto. O volume das importações subiu de USD 86, 2 bi para USD 216,5 bi entre 2006 e 2011, explicado principalmente pelo aumento do volume: USD 95 bi, e em menor proporção, pelo aumento dos preços: USD 35 bi. O gráfico II mostra o impacto dos preços internacionais nas despesas com importações entre 2006 e 2011.

Gráfico II



Fonte: Ministério do Desenvolvimento
Elaboração própria



Este resultado mostra alguns resultados preocupantes. O Brasil está aumentando o volume físico de importações, mas não o de exportações. O aumento das importações têm sido financiado pelo aumento de preços dos produtos exportados, e não por um dinamismo econômico que poderia aumentar a competitividade e fazer aumentar o volume exportado. Assim, a balança comercial brasileira hoje está muito dependente da dinâmica dos preços internacionais, o que pode ser um risco para o balanço de pagamentos se houver uma reversão da tendência de preços de commodities.


sábado, 15 de outubro de 2011

Existe Realmente Risco de uma Bolha no Setor Imobiliário no Brasil?.


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Quando observamos o rápido crescimento no valor dos imóveis em São Paulo e lembramos da crise imobiliária nos EUA em 2008, podemos facilmente ser induzidos a pensar que existe uma bolha imobiliária no mercado brasileiro, e que isto poderia levar a uma crise no setor bancário, assim como ocorreu nos EUA. Neste artigo, gostaria de colocar a minha experiência pessoal como morador de São Paulo, tentando detalhar o que eu observo no setor imobiliário, com o objetivo de entender se faz sentido pensar em bolha imobiliária.

Não existe um dado estatístico abrangente sobre a elevação global dos preços dos imóveis no Brasil. Existem alguns índices localizados, como a FIPE, que calcula a variação do preço para algumas cidades.  Segundo a FIPE, o aumento dos preços dos imóveis entre final de 2007 e setembro de 2011 foi de 113% na cidade de São Paulo e 150% no Rio de Janeiro. (fonte: http://migre.me/5VKLP). Na minha experiência pessoal, comprei meu apartamento no final de 2007 por R$ 3,5 mil o metro quadrado e hoje eu vejo anúncios no meu prédio de ofertas de vendas a R$ 9 mil o metro quadrado, ou seja, aumento bem superior ao calculado pela Fipe no mesmo período.

Eu observo as principais razões com causas do aumento dos preços dos imóveis:

  1. A cidade de São Paulo tem um problema crônico de trânsito e uma geografia desfavorável: os empregos estão concentrados em poucos bairros, e a maior parte da população gasta um tempo considerável para com locomoção, porque o transporte urbano é precário, e a extensão das linhas de metrô não é adequada para o tamanho da cidade. Por exemplo, eu moro a 6 km do escritório onde eu trabalho, e demoro em média 30 min para chegar de carro. É absolutamente normal um cidadão paulistano ficar no trânsito 2 a 3 horas por dia no trajeto de ida e volta ao trabalho, e até mais do que isto se utilizar transporte público. Desta forma, morar perto do trabalho passa a ser algo muito valorizado, e grande parte da população está disposta a pagar mais por isto.

  1. O crescimento econômico mundial entre 2003 e 2007 favoreceu particularmente o Brasil, que viu os preços das commodities dispararem (veja post em http://migre.me/5VJOT) e também fez o país receber um boom de novos investimentos. São Paulo é o centro econômico e financeiro do Brasil, onde estão instaladas a maioria das sedes das grandes empresas e também concentra os serviços de bolsas de valores e bancos de investimentos. Assim, o crescimento econômico do país, além da elevação do poder aquisitivo, atraiu para São Paulo um número maior de executivos e profissionais com salários altos, e conseqüentemente, uma demanda maior principalmente pelos imóveis mais caros nas regiões mais valorizadas.

  1. No Brasil, o imóvel ainda é visto como reserva de valor. Ainda persiste na memória o período de hiperinflação no Brasil que terminou em 1994, quando as pessoas compravam imóveis para se proteger da inflação. Até hoje, eu conheço pessoas que colocaram seus recursos em imóveis, mesmo considerando que, se o valor fosse investido em títulos públicos, o retorno teria sido muito maior do que o retorno no aluguel do imóvel.
  2. Há falta de terrenos viáveis em alguns bairros. Isto faz com que as construtoras tenham que adquirir residências e/ou imóveis prontos para derrubar e construir prédios. Isto tem um impacto nos custos de construção e no valor final dos imóveis.

  1. Ter um imóvel próprio sempre foi considerado culturalmente um sinônimo de segurança. A idéia de ter um imóvel próprio sempre foi vista sendo um “sonho”. Eu lembro de que, na minha infância, pagar aluguel era visto como depreciativo pelos outros. Isto quer dizer que a decisão de aquisição da “casa própria” tem um componente emocional, e não apenas econômico racional.

  1. Os custos da mão de obra para construção civil subiram bastante. O custo com mão-de-obra subiu 40% e os outros custos de construção subiram 25% entre dezembro de 2007 e setembro de 2011 em comparação com uma inflação de 23% no mesmo período. (Fontes: FGV e IBGE)

  1. Mudança na lei para locação de imóveis. Até 2008, a punição pelo o não-pagamento do aluguel era muito branda: a retirada de um inquilino inadimplente exigia um processo judicial e demorava de 6 meses a 1  ano. Com as alterações na lei, o processo tornou-se mais simples, dando mais segurança para quem comprava um aluguel com o objetivo de alugar.


Esta relação de motivos que justificam os preços elevados de imóveis em São Paulo não deve se modificar no curto prazo, e por isto, os preços dos imóveis devem se manter elevados. Mas, e se esta análise estiver errada, e realmente os preços dos imóveis caírem, quais serão as suas conseqüências? Antes de entrar na resposta, vamos entender como funciona o crédito imobiliário no Brasil:

  1. Os bancos, de maneira geral, não financiam 100% do valor do imóvel usado. Em geral, financiam entre 70% e 80% do valor total, e o tomador precisa pagar em dinheiro esta diferença, mas dá todo o imóvel como garantia. Isto significa que só valeria a pena deixar de pagar o imóvel se o preço dele cair mais do que 30%. Isto reduz significativamente o risco da inadimplência.

  1. Quando se compra um imóvel na planta em São Paulo, o comprador faz pagamentos para a construtora durante a fase de construção, e depois, na entrega do imóvel, financia o restante com um banco. Voltamos à mesma situação: o banco financia apenas parte do imóvel, mas tem ele inteiro como garantia. E se houver uma crise, os bancos provavelmente vão ficar mais seletivos na concessão do crédito, e conseqüentemente, o ônus maior vai ficar com as construtoras.


  1. O volume de crédito imobiliário no Brasil é muito pequeno, comparado com a maior parte dos países. Em 2011, a relação crédito imobiliário / PIB atingiu 6%, e representou 12,5 % da carteira total de empréstimos dos bancos. Isto quer dizer que, no evento em que exista uma inadimplência total, os bancos arcarão com uma perda suportável.

A minha conclusão é que, apesar do aumento dos preços dos imóveis, não se pode afirmar que existe uma bolha, mas, se por algum motivo ocorrer uma queda nos preços dos imóveis, não há risco para o setor bancário, e os grandes perdedores serão aqueles que compraram imóveis a preços elevados, e provavelmente as construtoras que não estiverem com custos adequados. Não vejo no horizonte uma crise com dimensões elevadas como nos EUA em 2008 ou Japão nos anos 80.